Filas refletem desejo por exclusividade e lifestyle internacional.

O fenômeno das longas filas em restaurantes e lojas com experiências instagramáveis tomou conta de São Paulo nos últimos meses, revelando uma tendência marcante no cenário gastronômico e de consumo da cidade. Desde a inauguração da rede americana de rosquinhas Krispy Kreme, com esperas de até quatro horas, até cafeterias com estética minimalista e hamburguerias temáticas, multidões se reúnem em busca de experiências exclusivas e cenários perfeitos para as redes sociais. Celebridades internacionais, como o confeiteiro Buddy Valastro, e marcas consagradas trouxeram novos ares para a cena paulistana, despertando a curiosidade e o desejo de consumidores ávidos por novidades e sensações únicas. Essa febre está diretamente ligada à busca por diferenciação, pertencimento a tendências globais e ao forte apelo de compartilhar momentos em ambientes visualmente marcantes. No centro desse movimento, está o público jovem e conectado, que valoriza o ineditismo, a exclusividade e, principalmente, a experiência proporcionada pelos estabelecimentos.

O contexto desse novo comportamento está enraizado em transformações sociais, econômicas e tecnológicas. O avanço das redes sociais, especialmente o Instagram e o TikTok, impulsionou o desejo de registrar e exibir momentos singulares, tornando ambientes temáticos e produtos visualmente atrativos verdadeiros objetos de desejo. Esse comportamento de consumo também reflete a influência de culturas estrangeiras, especialmente a norte-americana, no imaginário coletivo brasileiro. Locais como a Avenida Presidente Juscelino Kubitschek e bairros tradicionais como Liberdade e Jardins, tornaram-se palcos dessa febre, com consumidores dispostos a enfrentar filas apenas para ter o privilégio de dizer que participaram daquela experiência. Além disso, o apelo midiático das inaugurações de marcas renomadas e ações promocionais, como a distribuição gratuita de produtos, ajudam a criar um ambiente de grande expectativa e exclusividade, transformando a simples compra ou refeição em um verdadeiro evento social.

Os desdobramentos desse fenômeno vão além das filas e fotografias. Especialistas em sociologia do consumo apontam que o consumo deixou de ser apenas sobre o produto: trata-se de participar de um ritual, de vivenciar algo que transcende o simples ato de comer ou comprar. O status social e os símbolos associados à experiência somam um valor intangível, reforçado pela exposição digital. O setor gastronômico brasileiro, por exemplo, assistiu a um crescimento expressivo de modelos de negócios baseados em experiências personalizadas e ambientes cenográficos, estimulando a abertura de novas casas e a renovação de conceitos tradicionais. O sucesso dessas lojas e restaurantes tem impacto direto no desempenho econômico do setor de alimentação na cidade, gerando empregos, atraindo turistas e movimentando o comércio local. No entanto, também levanta debates sobre a efemeridade dessas tendências, a elitização de determinadas experiências e o papel das mídias sociais na criação de desejos cada vez mais instantâneos e descartáveis.

‘Queria reviver o gostinho da Disney’: loja de donuts dos EUA chega a SP com filas de 4 horas e valet de até R$ 60

É difícil passar pela Avenida Presidente Juscelino Kubitschek, na Zona Sul de São Paulo, sem notar a multidão que dobra o quarteirão para conhecer a primeira loja da Krispy Kreme no Brasil, inaugurada em 29 de abril. A famosa rede americana de donuts, que tem unidades em lugares icônicos como a Times Square e a Disney, rapidamente viralizou nas redes sociais brasileiras, com filas de até quatro horas e campanhas de distribuição gratuita.

A combinação do apelo visual dos produtos, o “lifestyle” americano e a sensação de exclusividade atraiu consumidores dispostos a enfrentar o calor e o preço. A dona de casa Silvia Martins, por exemplo, gastou R$ 145,70 entre donuts, água e estacionamento. Para ela, valeu a pena reviver a nostalgia da viagem à Disney.

Funcionários relataram que a movimentação começa uma hora antes da abertura, e que cerca de 200 carros passam diariamente pelo valet, que cobra de R$ 25 a R$ 60. A doméstica Sandra Gonçalves, enviada pela chefe para comprar donuts para o aniversário da filha, conseguiu atendimento rápido graças ao direito preferencial do motorista que a acompanhava.

Para a socióloga Camila Crumo, o sucesso está ligado à escassez percebida do produto e ao desejo de consumir algo considerado autêntico e “importado”. Mesmo com rosquinhas disponíveis no Brasil, a “donut americana” carrega um valor simbólico maior.

Ela também aponta o papel da influência cultural dos Estados Unidos: “Eles dominam a indústria cultural global com filmes, séries e padrões de consumo que promovem o estilo de vida americano como o mais desejável. Vivemos no Brasil sob esse bombardeio diário, o que explica a febre por produtos como esses donuts”.

O futuro das experiências instagramáveis em São Paulo

O cenário indica que as experiências instagramáveis vieram para ficar, ao menos enquanto as redes sociais mantiverem seu poder de moldar comportamentos de consumo. São Paulo, por sua vocação cosmopolita e capacidade de absorção de tendências, deve continuar assistindo à chegada de novas marcas, conceitos e experiências, sempre com o desafio de equilibrar novidade e autenticidade. Para os estabelecimentos, o sucesso depende cada vez mais da criatividade, da capacidade de encantar e de inovar continuamente, mantendo o público engajado e disposto a investir tempo e dinheiro por alguns minutos de exclusividade. Especialistas acreditam que a personalização das experiências será o próximo passo, com ambientes ainda mais imersivos, menus interativos e ações que estimulem o engajamento digital. Por outro lado, cresce também a consciência sobre a importância de oferecer qualidade além da estética, garantindo que a fama conquistada não se perca quando a novidade passar. Assim, a febre das experiências instagramáveis já está transformando não só o comércio, mas também o modo como vivenciamos e compartilhamos momentos em uma das maiores metrópoles do mundo.