Morre Vargas Llosa, Nobel de Literatura e defensor da direita

Vargas Llosa, gigante da literatura, já disse preferir Bolsonaro a Lula.
De apoiador de Fidel Castro a liberal.
O escritor Mario Vargas Llosa morreu domingo (13), aos 89 anos, na capital de seu país, Lima, no Peru. A causa da morte não foi informada pela família. A presidente do país, Dina Boluarte, decretou luto nacional nesta segunda-feira (14).
Llosa foi vencedor do prêmio Nobel de Literatura em 2010 e, além de conhecido por sua obra, também ganhou notoriedade como político declaradamente de direita. Nos últimos anos, também demonstrou apreço por figuras da direita, como o ex-presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.
O escritor peruano Mario Vargas Llosa, causou polêmica no Brasil quando declarou preferência por um candidato a presidente nas eleições de 2022: Jair Bolsonaro (PL).
“O caso de Bolsonaro é um caso muito difícil”, disse o escritor.
“As palhaçadas de Bolsonaro são muito difíceis de se admitir para um liberal. Mas entre Bolsonaro e Lula, prefiro Bolsonaro, desde já. Com as palhaçadas de Bolsonaro. Lula, não.”
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, também em 2022, Vargas Llosa disse que torcia pela derrota do petista, mas afirmou também não ter muita simpatia por Bolsonaro.
“Com sua posição sobre as vacinas, ele provocou uma verdadeira catástrofe no Brasil. Além disso, tem uma certa vocação pela palhaçada, não?”
O escritor afirmou ainda, segundo o jornal, que havia no Peru quatro presidentes com processos na Justiça em decorrência da operação Lava-Jato.
“Em grande parte, todos eles foram vítimas de Lula, pois ele utiliza, digamos, a Presidência para corromper os governantes latino-americanos. No Peru, causou estragos.”
Llosa disse que “não gostaria de estar na situação de ter que escolher entre Lula e Bolsonaro”, mas que “realmente jamais votaria em Lula”, pois “ele foi um homem que corrompeu profundamente.”
Quanto questionado pelo jornal sobre a anulação de processos contra Lula na Lava-Jato, ele disse que foi “por questões técnicas” e que “alguns juízes também têm seus preferidos na política. Torço para que não elejam de novo Lula, pois ele está muito associado à corrupção.”
Ganhou destaque no mundo literário em meio ao chamado “boom latino-americano”, dos anos 1960 e 1970, quando várias escritores, que passaram a figurar entre os mais consagrados da literatura mundial, apareceram para o grande público com um estilo próprio da cultura da região — entre eles Júlio Cortázar, Gabriel Garcia Marquez e Juan Rulfo.
No final dos anos 1970, Mario Vargas Llosa passou a residir em Londres, já como um escritor consagrado, que podia viver daquilo que escrevia.
Foi uma fase fundamental: presenciou a ascensão de Margaret Thatcher ao poder e, ao mesmo tempo, leu — e chegou a conhecer — grandes pensadores liberais contemporâneos, como Isaiah Berlin e Karl Popper.
Em uma mudança ideológica profunda, ele adotou as ideias liberais e, desde então — assim como havia feito anteriormente com as ideias de esquerda — passou a defendê-las com unhas e dentes, tanto por escrito quanto em público.
Embora tenha iniciado sua vida política flertando com a esquerda, logo fez a conversão à direita e ao liberalismo. Em 1990, quando já se colocava neste espectro político, foi candidato a presidente do Peru e perdeu para alguém ainda mais à direita, Alberto Fujimori, que, durante a campanha, passou a caracterizar Vargas Llosa como um neoliberal rico de direita radical.
Sua imagem como neoliberal alinhado à direita radical se manteve ao longo dos anos, apesar de também ter posições em temas sociais e políticos consideradas progressistas: defendia o aborto, a eutanásia, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a legalização das drogas e era crítico do tratamento dado por Israel aos palestinos.
Era um defensor da democracia como sistema político e considerava o capitalismo, o livre mercado e a globalização como os melhores caminhos para tirar um país da pobreza.
Em 2021, Vargas Llosa declarou voto na filha de Fujimori, Keiko de direita— a eleição foi então vencida por Pedro Castilho, de esquerda. No mesmo ano, apoiou José Antonio Kast, no Chile, que foi vencido por Gabriel Boric.
Outra aposta perdedora foi feita em 2019, quando se posicionou a favor de Maurício Macri contra Alberto Fernandez, que saiu vitorioso do pleito argentino. E, em 2022, viu seu favorito, Jair Bolsonaro, perder para Lula.
Em entrevista à BBC News Mundo (2019), disse que “o liberalismo está associado à ideia de liberdade, e acredito que a defesa das liberdades é algo absolutamente essencial”.
“Para o liberalismo, o essencial são as ideias, os valores, e dentro deles a ideia de liberdade é absolutamente central. Uma ideia que não pode ser dissociada, dividida ou fragmentada.”
Discurso marcante no Nobel de Literatura.
Mario Vargas Llosa, reconhecido como um dos mais importantes escritores da literatura latino-americana, emocionou o mundo ao proferir seu discurso de aceitação do Prêmio Nobel de Literatura em 2010. O autor peruano destacou a poderosa relação entre a literatura e a condição humana, afirmando que “a vida tal como é não nos basta”, realçando a insatisfação intrínseca do homem com o mundo que o cerca. Ele refletiu sobre como a leitura e a escrita são mecanismos para transcender as adversidades da existência, perpetuando o desejo de explorar outras realidades e fortalecer o espírito crítico. Para Vargas Llosa, a literatura é mais do que uma ferramenta de entretenimento; ela representa a própria essência da liberdade e a oposição a qualquer forma de opressão.
A literatura e o papel transformador
Vargas Llosa também abordou, em seu discurso, a importância da literatura como motor de transformações sociais e culturais. Ele ressaltou que, em contextos de pobreza, injustiça e analfabetismo, a literatura não é um luxo escapista, mas um meio de resistência e evolução. Segundo o autor, as histórias têm o poder de humanizar a sociedade, despertando aspirações e sonhos que desafiam conformismos e incentivam a luta por mudanças. Em sua análise, o escritor destacou que os regimes autoritários sempre temeram a literatura, por sua capacidade de inspirar ideias e resistir à censura e repressão. Assim, Vargas Llosa reafirmou o compromisso de sua obra com a denúncia social e a busca pela liberdade individual.
Impactos e análises do discurso
O impacto do discurso de Vargas Llosa ecoou amplamente, sendo reconhecido como uma celebração da literatura como protesto e força criativa. Ele argumentou que tanto ler quanto escrever são atos de rebeldia contra a realidade, permitindo ao ser humano viver múltiplas vidas por meio da ficção. O autor também pontuou que a literatura latino-americana, com suas raízes em línguas transplantadas, constitui um vasto território de expressão e resistência, profundamente moldado pelas adversidades políticas e sociais da região. Vargas Llosa enfatizou que a literatura não apenas denuncia injustiças, mas também forma consciências, alimenta esperanças e incentiva o progresso. Sua fala ressoou como um chamado à valorização das histórias como instrumentos de transformação.
Legado e perspectivas futuras
Ao concluir seu discurso, Vargas Llosa reforçou a ideia de que a literatura transcende limites temporais e geográficos, afirmando sua relevância universal e atemporal. Ele instigou os ouvintes a refletirem sobre o papel das artes na construção de sociedades mais justas e menos opressivas. O escritor peruano, cuja obra sempre explorou as complexidades humanas e sociais, deixou como legado não apenas grandes romances, mas também uma visão apaixonada sobre o poder transformador das palavras. Para o futuro, seu discurso permanece como uma inspiração para que escritores e leitores continuem a desafiar as imperfeições do mundo real por meio da imaginação e da criatividade, assegurando a perpetuação do espírito crítico e da liberdade.