Galípolo reafirma posição contra elevação do IOF como instrumento arrecadatório

Galípolo se posiciona contra alta em IOF para apoiar arrecadação e “louva” recuo de Haddad em medida.
Presidente do BC manifesta preocupação com medida fiscal.
O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, manifestou na sexta-feira (23) seu posicionamento contrário ao uso da elevação da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) como instrumento para aumento da arrecadação federal. A declaração foi feita um dia após o governo federal anunciar alterações nas normas do imposto por meio de decreto, com objetivo explícito de ampliar a arrecadação em aproximadamente R$ 60 bilhões nos próximos dois anos. Durante sua participação no XI Seminário Anual de Política Monetária, promovido pela Fundação Getulio Vargas, Galípolo enfatizou que sua oposição à medida não é recente, tendo já demonstrado desconforto com essa alternativa em discussões anteriores, ainda quando ocupava o cargo de secretário-executivo do Ministério da Fazenda. O presidente da autoridade monetária destacou que nunca teve “muita simpatia pela proposta” e que não “gostava da ideia” de utilizar o IOF como mecanismo para atingir metas fiscais. Embora as mudanças nas alíquotas tenham sido anunciadas pelo governo como necessárias para o equilíbrio das contas públicas, a medida gerou forte reação no mercado financeiro, levando o Ministério da Fazenda a recuar parcialmente de algumas das alterações anunciadas na quinta-feira, o que deverá reduzir o ganho de arrecadação em aproximadamente R$ 6 bilhões até 2026.
O contexto da declaração de Galípolo está diretamente relacionado à decisão do governo federal de modificar as taxas cobradas de empresas em operações de crédito e uniformizar as tarifas incidentes sobre operações de saída de recursos do país (câmbio) em 3,5%. Além disso, o decreto também estabeleceu a cobrança de imposto sobre remessas de fundos para o exterior, também na taxa de 3,5%, entre outras iniciativas. Conforme estimativas divulgadas pelo Ministério da Fazenda, a expectativa é que as mudanças no IOF elevem as receitas em R$ 20 bilhões ainda em 2025 e em R$ 41 bilhões em 2026, totalizando mais de R$ 60 bilhões em dois anos. Interlocutores próximos ao presidente do BC indicaram que Galípolo teria sido pego de surpresa pelo anúncio realizado pelo Ministério da Fazenda, embora o secretário-executivo da pasta, Dario Durigan, tenha afirmado que o ministro Fernando Haddad havia conversado com o presidente do Banco Central sobre o assunto durante reunião realizada na última terça-feira. Os secretários da Fazenda ainda destacaram que as medidas anunciadas deveriam contribuir para o esforço do BC no controle da inflação, argumento que aparentemente não foi suficiente para angariar o apoio de Galípolo à iniciativa. As alterações no IOF incidentes sobre atividades de câmbio representam uma interrupção no processo de adequação aos padrões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e podem resultar em encarecimento de compras e investimentos de brasileiros no exterior.
Em sua manifestação, o presidente do Banco Central demonstrou preocupação específica com os efeitos da medida sobre o mercado financeiro, especialmente pelo risco de ser interpretada como uma forma indireta de controle cambial. “Minha antipatia e resistência ao uso da alíquota do IOF como expediente para perseguir a meta fiscal decorre justamente desse receio”, explicou Galípolo, referindo-se à possibilidade de as alterações serem vistas como mecanismo de intervenção no câmbio. Essa preocupação foi rebatida durante coletiva de imprensa realizada para explicar a medida, quando o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, negou categoricamente que o objetivo da iniciativa fosse conter a valorização do dólar, afirmando não haver intenção de promover qualquer forma de intervenção cambial. Apesar da controvérsia inicial, Galípolo fez questão de reconhecer a rapidez com que o Ministério da Fazenda agiu para corrigir aspectos problemáticos da medida, destacando que as alterações não causaram danos significativos por terem ocorrido com o mercado financeiro fechado. “Todo mundo precisa louvar e reconhecer o ministro, como bom democrata que é. Em poucas horas após o anúncio da medida, ela já estava suprimida. Antes mesmo de o mercado abrir, ele já tinha ouvido a sociedade, ouvido os agentes”, afirmou o presidente do BC, em referência à agilidade com que Fernando Haddad respondeu às críticas. Galípolo ainda reconheceu a complexidade do processo de busca pelo alcance das metas fiscais, destacando que o Ministério da Fazenda enfrenta desafios significativos nesse sentido, principalmente pela necessidade constante de negociação.
A divergência pública entre o presidente do Banco Central e o Ministério da Fazenda acerca da elevação do IOF evidencia a complexidade da coordenação entre política monetária e fiscal no atual cenário econômico brasileiro. Embora ambas as instituições compartilhem o objetivo comum de promover estabilidade econômica, as diferentes perspectivas sobre os instrumentos mais adequados para atingir esse fim ficam evidentes no episódio. Para especialistas em economia, a elevação de impostos sobre operações financeiras pode, de fato, gerar distorções no mercado e desincentivar investimentos produtivos, uma vez que aumenta o custo das transações e pode afetar negativamente o fluxo de capitais. Por outro lado, representantes do governo argumentam que a medida se faz necessária dentro do contexto de busca pelo equilíbrio fiscal, essencial para a estabilidade macroeconômica de longo prazo. Olhando para o futuro, a expectativa é que o episódio sirva como aprendizado para uma melhor articulação entre o Banco Central e o Ministério da Fazenda, especialmente em decisões que afetam diretamente o mercado financeiro. O recuo parcial do governo nas medidas anunciadas demonstra sensibilidade às reações do mercado e disposição para ajustes quando necessário. No entanto, o desafio de encontrar mecanismos eficientes para aumentar a arrecadação sem comprometer o ambiente de negócios permanece como uma questão central para a política econômica brasileira nos próximos anos, especialmente diante da necessidade de conciliar o atendimento às metas fiscais com a promoção do crescimento econômico sustentável.
Impactos no mercado e perspectivas futuras
A postura de Galípolo demonstra a preocupação da autoridade monetária com medidas que possam ser interpretadas como controle indireto de capital, tema sensível para investidores internacionais. O episódio evidencia a necessidade de maior coordenação entre política monetária e fiscal, especialmente em um contexto econômico desafiador. A rápida resposta do Ministério da Fazenda ao recuar parcialmente das medidas sugere que o governo está atento às reações do mercado, mas o desafio de equilibrar as contas públicas sem prejudicar o ambiente de negócios permanece como questão central para a economia brasileira nos próximos anos.