China suspende publicação de dados econômicos em meio à crise

China suspende publicação de dados econômicos em meio à crise
Governo chinês interrompe divulgação de centenas de indicadores econômicos
O governo da China interrompeu a divulgação de centenas de indicadores econômicos enquanto o país enfrenta dificuldades financeiras significativas, segundo reportagem publicada pelo Wall Street Journal no último domingo (4). A investigação conduzida pelos jornalistas Rebecca Feng e Jason Douglas revela que dados essenciais sobre vendas imobiliárias, investimentos estrangeiros e taxas de desemprego simplesmente desapareceram dos relatórios oficiais nos últimos anos. Além disso, informações sobre o índice de confiança empresarial foram cortadas e até mesmo os relatórios sobre a produção de molho de soja – um indicador considerado relevante para a economia local – sumiram completamente das estatísticas governamentais. Esta suspensão na transparência de dados ocorre em um momento particularmente delicado para a segunda maior economia do mundo, que enfrenta problemas estruturais como endividamento excessivo e um mercado imobiliário em franco declínio, com quedas constantes desde 2018. O caso mais emblemático dessa nova política de ocultação de informações é a interrupção da divulgação das vendas imobiliárias exatamente quando o setor entrava em colapso em 2022, após anos de queda nas transações.
O Departamento Nacional de Estatísticas da China também parou de publicar números relacionados ao desemprego em áreas urbanas, especialmente entre jovens, uma métrica crucial para avaliar a saúde econômica do país. De acordo com o Wall Street Journal, em muitos casos não há sequer uma justificativa oficial para a retirada desses dados dos relatórios públicos, o que tem intensificado as suspeitas sobre a real situação econômica chinesa. Esta falta de transparência aumenta significativamente as dúvidas internacionais sobre os números oficiais apresentados por Pequim, incluindo o Produto Interno Bruto (PIB), que segundo o governo cresceu exatamente conforme o planejado: 5,2% em 2023 e 5% em 2024. Entretanto, instituições financeiras independentes como o Bank of Finland e a consultoria Capital Economics contestam esses números, sugerindo que o crescimento real da economia chinesa pode ter ficado entre 2,4% e 3,7%, dependendo da metodologia utilizada. O Goldman Sachs também produziu suas próprias estimativas baseadas em dados de consumo doméstico e importações coletados de fontes alternativas, chegando a um crescimento de apenas 3,7% para 2024, bem abaixo dos 5% divulgados oficialmente pelo governo chinês.
Diante desse cenário de obscurecimento estatístico, economistas e analistas financeiros internacionais têm buscado fontes alternativas para medir com maior precisão o desempenho da economia chinesa. Entre os métodos alternativos adotados estão a análise do consumo de energia, as taxas de ocupação em estabelecimentos como academias e salões de beleza, a movimentação urbana captada por imagens de satélite e até mesmo dados de vendas de bilheteria de cinema, que podem oferecer indícios sobre o poder de consumo da população. Em dezembro do ano passado, durante uma conferência em Washington, o economista chinês Gao Shanwen, da SDIC Securities, empresa de serviços financeiros da China, admitiu publicamente que o crescimento econômico do país pode ter ficado próximo de 2% nos últimos anos e que não era possível determinar “o verdadeiro número do crescimento real da China” com base apenas nos dados oficiais. A censura estatística implementada pelo governo chinês também afetou áreas sensíveis relacionadas à pandemia de Covid-19, como demonstra a interrupção na divulgação do número de cremações após o encerramento da política de Covid zero no país, o que impossibilita uma estimativa clara do número real de mortes causadas pela doença. Adicionalmente, dados sobre vacinação infantil, considerados importantes termômetros demográficos, também desapareceram dos relatórios governamentais.
A interrupção na divulgação de dados econômicos pela China representa um desafio significativo para investidores globais e para a economia internacional como um todo, uma vez que o país asiático continua sendo um dos principais motores do crescimento mundial. Analistas apontam que essa falta de transparência pode prejudicar a confiança dos investidores estrangeiros e potencialmente impactar negativamente os fluxos de capital para o país no médio e longo prazo. As dificuldades econômicas enfrentadas pela China atualmente – que incluem o colapso do setor imobiliário, tensões geopolíticas e os impactos da guerra comercial com os Estados Unidos – parecem estar motivando a decisão de restringir o acesso a indicadores que poderiam expor a fragilidade da economia nacional. Este cenário de opacidade estatística surge justamente no momento em que a atividade industrial chinesa registrou contração em abril, possivelmente influenciada pelas novas tarifas impostas pelos Estados Unidos, conforme indicado pelo Índice de Gerentes de Compras (PMI) divulgado recentemente. As perspectivas para a economia chinesa permanecem incertas, e a falta de dados confiáveis dificulta ainda mais qualquer previsão acurada sobre o futuro econômico do país. Enquanto isso, o presidente Xi Jinping tem declarado que a economia chinesa precisa se adaptar às mudanças externas, sinalizando possíveis ajustes na estratégia econômica do país para enfrentar os desafios atuais em um ambiente global cada vez mais competitivo e tenso.
Economia global reage com preocupação à falta de transparência chinesa
A suspensão na divulgação de dados econômicos pela China ocorre em um momento delicado para a economia global, com mercados já sensíveis às tensões comerciais entre as grandes potências. A falta de transparência do gigante asiático pode comprometer as análises de risco dos investidores internacionais e dificultar a formulação de políticas econômicas coordenadas em escala global. Especialistas acreditam que, sem acesso a informações confiáveis sobre a segunda maior economia do mundo, as previsões econômicas globais tornam-se significativamente menos precisas, podendo levar a decisões equivocadas por parte de governos e instituições financeiras. A comunidade internacional acompanha com atenção os próximos passos do governo chinês, especialmente no que diz respeito à possível retomada da transparência estatística, considerada fundamental para a estabilidade dos mercados financeiros globais.