Áudios revelam uso político de programa cultural de R$ 58 milhões

Programa cultural de R$ 58 milhões beneficiou aliados políticos, revelam áudios.
Secretária do PT admite uso eleitoral de comitês de cultura.
Áudios divulgados pelo jornal O Estado de S. Paulo revelam que os comitês de cultura criados pelo governo federal, com orçamento de R$ 58,8 milhões, foram utilizados para beneficiar aliados políticos nas eleições municipais de 2024. As gravações envolvem Anne Moura, secretária nacional de Mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT), que admite ter recebido aval do Ministério da Cultura para usar a estrutura do Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC) em sua campanha a vereadora em Manaus. O material, gravado pelo ex-chefe do comitê do Amazonas, Marcos Rodrigues, expõe uma série de irregularidades no uso dos recursos públicos destinados ao fomento cultural.
O PNCC foi criado em setembro de 2023 com o objetivo de impulsionar ações de mobilização, apoio e formação de artistas em todo o país. No entanto, os áudios sugerem que o programa foi desvirtuado para atender interesses eleitorais do PT e seus aliados. Anne Moura é ouvida exigindo que Marcos Rodrigues envolvesse a estrutura do comitê de cultura em sua campanha eleitoral, alegando que a secretária do Ministério da Cultura responsável pelo PNCC, Roberta Martins, considerava “um absurdo” a falta de empenho do comitê amazonense em apoiar candidaturas alinhadas ao partido. A gravação também revela que Anne Moura buscou ajuda financeira junto ao ministério para sua campanha, evidenciando uma possível confusão entre as esferas pública e partidária.
As revelações levantam sérias questões sobre a gestão e a transparência do Programa Nacional de Comitês de Cultura. Segundo as gravações, Anne Moura defendeu que os artistas escolhidos para as atividades culturais deveriam ser “combinados na política”, sugerindo uma seleção baseada em critérios partidários e não em mérito artístico. Além disso, a secretária do PT argumentou que aqueles que apoiaram o partido em momentos difíceis deveriam ter “atendimento diferenciado” na distribuição dos recursos e oportunidades do programa. Essa abordagem não apenas compromete a integridade do PNCC, mas também levanta preocupações sobre a equidade no acesso aos recursos públicos destinados à cultura. O caso ganha ainda mais relevância ao se considerar que o Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia (Iaja), do qual Anne Moura é uma das fundadoras, foi contratado para coordenar o comitê no Amazonas, recebendo R$ 1,9 milhão em dois anos.
As repercussões deste escândalo prometem ser significativas, tanto para o Ministério da Cultura quanto para o Partido dos Trabalhadores. A oposição já se mobiliza para exigir investigações rigorosas sobre o uso dos recursos do PNCC e a possível prática de improbidade administrativa. O Ministério Público Federal poderá ser acionado para apurar as denúncias, enquanto o Tribunal de Contas da União pode vir a realizar uma auditoria nos gastos do programa. Para o governo, o episódio representa um duro golpe em sua credibilidade, especialmente no que diz respeito à gestão de políticas culturais. A ministra Margareth Menezes deverá prestar esclarecimentos ao Congresso Nacional, e é possível que haja uma revisão nos critérios de seleção e fiscalização dos comitês culturais em todo o país. O caso também expõe as fragilidades na relação entre partidos políticos e a administração pública, reacendendo o debate sobre a necessidade de maior transparência e controle social na execução de programas governamentais.
Investigações e possíveis consequências para o programa cultural
O escândalo envolvendo o uso político do Programa Nacional de Comitês de Cultura deve resultar em uma série de investigações e possíveis reformulações na política cultural do governo federal. A sociedade civil e os setores artísticos independentes cobrarão medidas para garantir que os recursos públicos sejam distribuídos de forma justa e transparente, sem interferências partidárias. O futuro do PNCC está em xeque, e sua continuidade dependerá da capacidade do Ministério da Cultura em demonstrar que pode gerir o programa de maneira ética e eficiente, priorizando o desenvolvimento cultural do país acima de interesses eleitorais.