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Bolívia vira refúgio estratégico de chefes do PCC

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“Mijão” vive foragido na Bolívia, esconderijo preferido de chefes do PCC.

Corrupção e localização fortalecem abrigo de criminosos.

Nas últimas semanas, a Bolívia voltou ao centro das atenções do noticiário policial internacional após a prisão de Marcos Roberto de Almeida, conhecido como Tuta, líder da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), em Santa Cruz de la Sierra. O episódio reforça a constatação de que o país vizinho se consolidou como o principal esconderijo de chefes da organização criminosa brasileira, principalmente devido à facilidade de suborno a autoridades locais, à possibilidade de obtenção de documentos falsos e à proximidade com grandes fornecedores de cocaína da América do Sul. Desde a segunda metade dos anos 2000, a Bolívia substituiu o Paraguai como destino preferencial desses criminosos, permitindo aos líderes não apenas se manterem em liberdade, mas também continuar comandando a facção à distância. O caso de Tuta ilustra o nível de tranquilidade que esses chefes desfrutam: ele foi detido quando tentava renovar sua identidade estrangeira junto a autoridades bolivianas, sem qualquer receio de ser capturado pelas forças locais ou internacionais. Essa confiança é alimentada por uma rede de proteção forjada na corrupção endêmica de segmentos das forças de segurança bolivianas, que permite a traficantes como Tuta e outros nomes de peso do PCC, como Forjado, Chacal, André do Rap e Mijão, viverem com ostentação e comandarem negócios milionários na região, longe do alcance da polícia brasileira.

O predomínio da Bolívia como esconderijo dos principais chefes do PCC resulta de um conjunto de condicionantes específicos. O país não só faz fronteira com Estados estratégicos como Mato Grosso do Sul, rota tradicional do tráfico, mas também compartilha as fontes primárias da cocaína comercializada pelo PCC no Brasil, como Peru e Colômbia. Essa conjuntura permite que criminosos mantenham relações diretas com grandes fornecedores e, assim, adquiram drogas para abastecimento do mercado nacional e internacional de maneira eficiente. Casos como o de Sérgio Luiz de Freitas, o Mijão, mostram que o abrigo na Bolívia não se restringe à fuga, mas proporciona uma vida pública e luxuosa: há registros dele levando filhos à escola e atuando como empresário, proprietário de casas de shows e restaurantes em Santa Cruz de La Sierra, a cidade mais rica do país. Segundo o Ministério Público paulista, o PCC movimenta aproximadamente um bilhão de dólares ao ano, controlando novas rotas para a Europa, África e Ásia, a partir do território boliviano. Toda essa estrutura é possível graças à histórica fragilidade da cooperação policial entre Brasil e Bolívia, à corrupção policial e à existência de redes locais de proteção, que blindam esses chefes mesmo diante de condenações e mandados de prisão no Brasil.

O acirramento das operações brasileiras contra o tráfico, especialmente nos últimos anos, criou um fenômeno de migração das principais lideranças da facção para a Bolívia. Observa-se a formação de núcleos como o da Sintonia Final em Santa Cruz de La Sierra, responsáveis não apenas pelo comando de atividades ilícitas, mas pela expansão da influência do PCC no tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro. Investigações do Gaeco e do Ministério Público de São Paulo apontam que, mesmo com tentativas de cooperação, as prisões importantes como a de Tuta não representam necessariamente uma nova fase de integração entre polícias dos dois países, mas movimentos pontuais desencadeados por fatores específicos e muitas vezes por descuido dos próprios criminosos. O conforto e a segurança sentidos pelos chefes do PCC na Bolívia os permitem continuar ostentando riqueza, administrar grandes propriedades e movimentar uma frota de aeronaves, enquanto protagonizam a alta cúpula do crime organizado brasileiro. A ausência de respostas efetivas por parte do governo boliviano, incapaz ou desinteressado de reprimir a presença desses criminosos, faz do país um ambiente ideal para que o PCC mantenha e amplie seu império no narcotráfico continental.

O cenário de impunidade e proteção oferecido pela Bolívia desperta crescente preocupação em autoridades brasileiras, que veem na relação frouxa entre os sistemas policiais o maior desafio contemporâneo no combate ao crime transnacional. Com a detenção de Tuta, surge o temor, entre outros líderes foragidos, de que o ciclo de segurança possa ser rompido por novas operações, ainda que isoladas. A perspectiva, porém, permanece incerta: especialistas e promotores avaliam que a presença do PCC no país vizinho só tende a se fortalecer enquanto perdurarem as condições de corrupção, ausência de fiscalização rígida e facilidade de circulação para criminosos. A constante movimentação de chefões da facção e a manutenção de atividades criminosas em solo boliviano demonstram que o país segue como o principal centro logístico do PCC fora do Brasil, sustentando a organização como o maior grupo criminoso do continente sul-americano. O combate efetivo ao avanço da facção depende, segundo especialistas, da ampliação dos esforços conjuntos de inteligência, mudanças institucionais e de uma cooperação interestatal mais robusta – desafios que ainda se colocam como obstáculos a serem superados nos próximos anos.

Quem é Tuta

Antes de se envolver com o PCC, Tuta atuou como adido comercial no Consulado de Moçambique em Minas Gerais, entre 2018 e 2019, recebendo R$ 10 mil para tratar de assuntos relacionados ao intercâmbio comercial com o Brasil, vinculado à embaixada moçambicana. Demitido do consulado, ele ascendeu em 2020 ao posto de principal líder do PCC em liberdade. Expulso da facção dois anos depois, acusado de enriquecer às custas da organização, Tuta acabou retornando ao grupo, com a missão de resgatar lideranças do PCC detidas em penitenciárias federais.

“Mijão” vive foragido na Bolívia

Sérgio Luiz de Freitas Filho, conhecido como “Mijão”, foragido e condenado pela Justiça de Ivinhema, integra a “Sintonia Final”, cúpula máxima do PCC, sendo um dos criminosos mais influentes, segundo investigações do Ministério Público de São Paulo. O promotor Lincoln Gakiya, que há 20 anos investiga a facção, destaca que a cúpula gerencia desde o tráfico até contatos com fornecedores e compradores internacionais.

A condenação de Mijão em Ivinhema está relacionada a 58 quilos de cocaína apreendidos em 4 de novembro de 2013, em Amandina, distrito do município, transportados em um Hyundai Veracruz para abastecer pontos de venda do PCC em São Paulo. Além de Mijão, outros líderes do PCC, como André Oliveira Macedo (“André do Rap”), Sílvio Luiz Ferreira (“Cebola”) e Pedro Luiz da Silva (“Chacal”), também estariam refugiados na Bolívia. Segundo o jornal Estadão, Patrick Velinton Salomão, o “Forjado”, apontado como atual líder da facção nas ruas, também vive no país vizinho, embora não seja foragido, tendo sido absolvido de todas as acusações do

Major suspeito de acobertar Tuta, chefão do PCC, é preso na Bolívia

O major Gabriel Soliz Heredia, chefe da Força Especial de Combate à Violência da Bolívia, foi preso em 23 de maio por suspeita de proteger o traficante brasileiro Marcos Roberto de Almeida, conhecido como Tuta, uma das lideranças do PCC. A suspeita surgiu após Tuta ser preso ao tentar renovar sua identidade com documentos falsos em Santa Cruz de la Sierra. Câmeras de segurança flagraram um encontro amistoso entre ele e o major, antes da prisão.

Durante o atendimento no órgão boliviano, um funcionário identificou um alerta da Interpol contra Tuta e acionou a polícia. O criminoso foi preso, enquanto Heredia e um segurança fugiram. Tuta foi expulso da Bolívia e entregue à Polícia Federal brasileira, sendo levado para a Penitenciária Federal em Brasília. Ele era procurado desde 2020, quando escapou da Operação Sharks, após pagar propina a policiais. O major Heredia agora é investigado por envolvimento e possível proteção ao traficante.

Desafios persistem na repressão ao crime transnacional

Diante do avanço do PCC em território boliviano, o alerta emitido por promotores e especialistas ressalta que a falta de cooperação e a fragilidade institucional continuam alimentando o poder da facção fora do Brasil. A recente prisão de Tuta, embora relevante, não indica uma mudança estrutural nas relações entre os sistemas de segurança dos dois países, mas sim a vulnerabilidade de indivíduos específicos em cenários pontuais. O desafio permanece na construção de canais mais efetivos de colaboração, capazes de neutralizar as redes de corrupção e desarticular os núcleos de proteção que garantem a permanência e o comando de chefias criminosas em solo estrangeiro. O futuro do combate ao tráfico internacional passa por reformas profundas, não só no campo policial, mas também no fortalecimento institucional e diplomático, de modo a reverter o quadro de impunidade e desestabilizar o domínio do PCC além das fronteiras nacionais. Nesse cenário, a Bolívia se mantém como epicentro das estratégias de expansão do crime organizado, exigindo respostas mais coordenadas e firmes das autoridades brasileiras e sul-americanas para fechar o cerco a quem, até agora, encontra refúgio e liberdade para continuar ditando as regras do tráfico internacional.

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