Crise no INSS abala tentativa de recuperação da popularidade do governo Lula

Fraudes no INSS fazem corrupção voltar a ser tema explorado contra petismo.
Escândalo bilionário afeta imagem do governo junto a aposentados.
A crise do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem se mostrado o maior desafio à popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desde o início de seu mandato. O escândalo, que veio à tona após operação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União (CGU), revelou um esquema bilionário de fraudes que desviou aproximadamente R$ 6,3 bilhões de aposentados e pensionistas desde 2016, através de descontos indevidos em seus benefícios. As investigações apontam que entidades sindicais e associações cadastravam beneficiários do INSS sem autorização, utilizando assinaturas falsas para aplicar descontos mensais diretamente na folha de pagamento. A gravidade da situação já provocou uma série de consequências políticas, incluindo a demissão do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), em 2 de maio de 2025, marcando o ápice da crise política até o momento. O escândalo é particularmente danoso para o governo porque atinge diretamente os aposentados de baixa renda, que representam parte significativa da base eleitoral do PT. Segundo membros da base governista, a crise é especialmente prejudicial por envolver um tema de fácil compreensão para a população: o roubo contra idosos, o que amplifica seu potencial de desgaste junto à opinião pública.
O esquema fraudulento operava por meio dos Acordos de Cooperação Técnica (ACTs), que permitiam descontos de mensalidades associativas nos benefícios previdenciários. As entidades justificavam esses descontos com a oferta de benefícios como planos de saúde, seguros e auxílio-funeral, mas os valores eram cobrados sem a devida autorização dos beneficiários. Muitos aposentados só perceberam os descontos ao consultarem seus extratos e, em diversos casos, recorreram à Justiça para reaver seus direitos. As investigações indicam que os convênios entre essas entidades e o INSS, que permitiam os descontos automáticos, foram ampliados durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) e continuaram no início do governo Lula, afetando aproximadamente 4,1 milhões de pessoas. Entre 2023 e o primeiro semestre de 2024, os descontos indevidos superaram R$ 3,2 bilhões, e em 95% dos casos, os beneficiários afirmaram que não autorizaram os débitos. Após a revelação do esquema, a CGU determinou a suspensão dos ACTs, medida que foi oficializada pelo INSS, que publicou uma norma suspendendo os acordos. O ministro-chefe da CGU, Vinícius de Carvalho, garantiu que “a partir de agora, nenhum aposentado será descontado da sua folha de pagamento”. Além disso, o presidente Lula determinou a demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e nomeou o procurador-federal Gilberto Waller Júnior para assumir o cargo.
A crise no INSS tem gerado intensa movimentação política, com a oposição articulando a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso para investigar o caso. Diante da força da oposição para instalar a comissão, governistas já começam a admitir nos bastidores que podem apoiar a iniciativa, desde que a gestão de Jair Bolsonaro também seja investigada. O senador Fabiano Contarato (PT-ES) foi o primeiro parlamentar do PT a assinar o pedido de criação da CPI, em 15 de maio de 2025. A mudança de postura ocorreu no mesmo dia em que o novo ministro da Previdência, Wolney Queiroz (PDT), foi ao Senado falar sobre o caso, onde tentou esfriar os ânimos dos parlamentares e tirar a responsabilidade do governo Lula. Durante a sessão, o ministro chegou a trocar acusações sobre as fraudes com o senador e ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Sergio Moro (União Brasil-PR). Parlamentares da base aliada reconhecem que o governo demorou a reagir à crise, uma vez que denúncias de fraudes já eram feitas por servidores do INSS desde o governo Michel Temer (MDB). Em uma ação para desgastar a gestão petista, vereadores do PL foram orientados a fazer gabinetes itinerantes pelo país para ajudar aposentados vítimas da fraude, ampliando o impacto político do escândalo.
Perspectivas de longo prazo para a Previdência agravam cenário político
Para além da crise imediata causada pelo escândalo das fraudes, o INSS enfrenta desafios estruturais de longo prazo que preocupam o governo e economistas. Segundo estimativas oficiais presentes no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enviado ao Congresso em abril, o déficit do INSS deve mais que quadruplicar nos próximos 75 anos. Para 2025, a previsão é de que o rombo atinja 2,58% do PIB, ou R$ 328 bilhões, enquanto para 2100, a expectativa é que totalizará 11,59% do PIB, ou R$ 30,88 trilhões. A explicação para esse crescimento exponencial do déficit está na combinação do envelhecimento da população brasileira com a queda no número de nascimentos, resultando em um cenário onde haverá cada vez mais pessoas recebendo aposentadoria e menos trabalhadores contribuindo com o sistema previdenciário. Além disso, críticos apontam que a crise do INSS faz parte de um projeto maior que estaria a serviço do desmonte da Previdência Social, favorecendo o setor de previdência privada. O novo Programa de Gestão de Desempenho (PGD), implementado pelo INSS em 2025 com base em orientações do Ministério da Gestão e Inovação, teria como consequências a retirada de direitos dos servidores e o enfraquecimento das políticas sociais, ao acabar com a jornada de trabalho e prever descontos salariais caso o servidor não cumpra as metas impostas. Nesse cenário complexo, o governo Lula enfrenta o duplo desafio de resolver a crise imediata das fraudes enquanto tenta apresentar soluções para a sustentabilidade do sistema previdenciário no longo prazo, tudo isso em um contexto de grande desgaste político e queda de popularidade.